terça-feira, 30 de agosto de 2011

Autoentrevista (I)


Partindo do facto de que não somente a plena prática da Filosofia exige preliminarmente um alto grau de autoconhecimento, mas sim toda a vida intelectual que um homem pode ter, inicio aqui uma série de post que consistem exatamente em auxiliar-me nesse exercício do autoconhecimento, através de entrevistas que faço a mim mesmo, abordando diversos aspectos que me dispertam a atenção e me são importantes. A frequência com que serão postados aqui essas “autoentrevistas” não está determinada, só posso garantir que serão feitas na medida do possível. Começarei por perguntas bastante gerais:


1)Como foi o ambiente em que você cresceu? Isto é, gostaria de saber mais sobre a sua infância

Bom, pode soar bastante simplista, mas eu posso dizer que cresci numa boa família, numa boa casa. Não porque fôssemos ricos – nunca fomos- mas porque o ambiente familiar sempre foi muito agradável e caloroso. Minha mãe sempre pensou no melhor para mim e para a minha irmã, tal como fazia também o meu pai. Ambos trabalharam duro para nos dar um bom nível de vida (estudamos em bons colégios, tínhamos bons brinquedos e roupas e nunca faltou boa comida em casa), mas tudo demandou sacrifícios, às vezes bastante altos. Mais do que isso, só consigo lembrar da minha infância como uma época em que havia muito amor em minha casa assim como em toda a família. Não que nunca houvessem desentendimentos e problemas, é claro que havia, mas nada que ferisse gravemente essa convivência sadia e harmoniosa (acho, aliás, que a única família na qual não houve brigas foi a Sagrada Família).

Vivíamos no terceiro andar de um edifício da Rua Frei Mansueto, em Fortaleza (nos mudamos em 2002). Pelo que me lembro, a vizinhança era boa, tinha alguns amigos entre os meninos do prédio, com os quais brincava bastante. Aliás, as memórias de minha infância são repletas de brincadeiras e felicidade. Foi uma época muito boa, muito construtiva. Pena que perdi contato com todos daquele tempo.

Me dava muito bem com meus primos quando criança e ainda sou bastante chegado a alguns deles. Novamente, ao falar disso, lembro-me das ótimas brincadeiras que tivemos, especialmente nas férias: dormíamos uns na casa dos outros brincando de jogos de tabuleiro, “carimba” (jogo com bola que os sudestinos chamam de “queimado”), bonecos de super-heróis da TV e dos quadrinhos, desenhos animados e séries televisivas infanto-juvenis, etc. Acho que essas brincadeiras, longe de representarem apenas momentos lúdicos, foram importantes para a minha formação e desenvolvimento.


2)E a escola e as amizades?

Tive alguns amigos na escola, não muitos. Acontece que sou um tanto tímido e introspectivo e isso não facilita a conquista de muitas amizades (lembro-me até que, aos 7 ou 8 anos minha mãe me levou para umas sessões com uma psicóloga para tratar dessa minha dificuldade em me relacionar com as outras crianças na escola). Se eu fosse mais expansivo, como a minha irmã, talvez teria hoje uma coleção de amigos. Também perdi contacto com eles. Minha vida, de facto, é feita de uma sucessão de rupturas (risos). Mas não perco de vista o que acontece com o que “se rompeu”.


3)Desde o fim da infância que você demonstra um interesse mais pronunciado pelas Humanidades. Como foi isso?

Sim, desde essa época que eu me interesso pelas Ciências Humanas. Começou com a História, que é como que a primeira das Humanidades que as crianças estudam. Sempre me fascinaram os relatos históricos e eu achava incrível recriar em minha mente aqueles factos narrados nos livros. Obviamente, por esta época, o meu interesse por História não era exatamente científico (não tinha nada desse negócio de metodologias, bibliografia indispensavel, clássicos, etc). Ele era como que uma extensão do meu gosto por filmes, seriados e desenhos animados. Com o passar dos anos e o meu amadurecimento é que isso mudou, passando a História a ser algo como um irmão da Política até ser algo como uma conhecimento de necessidade existencial. Mas até hoje não se como se pode estudar História sem tentar reviver aquelas narrativas na própria mente e na própria alma (salvo engano, Benedetto Croce disse algo nesse sentido).

No rastro da História veio a Geografia, que é meio hibrida, já que junda aspectos das Humanidades com as Ciências Naturais. Era uma matéria da qual eu gostava bastante na escola, especialmente da parte humana. Confesso, porém, que desde que ingressei na Universidade não li mais nada sobre geografia.

A Filosofia veio do estudo mais demorado da História. Eu, muito interessado pela Grécia Antiga, pela Idade Média, pelas civilizações orientais (sempre tive interesse enorme pela China e pelo Japão) e pelos séculos XVIII, XIX e XX, não podia permanecer indiferente ao que os filósofos dessas épocas diziam e pensavam, já que era parte importante da História e que, muitas vezes, transcendia a sua época, fazendo discípulos e continuadores em outras épocas e lugares. Aí minha atração pela matéria foi se acentuando, até que conheci o filósofo Olavo de Carvalho ( já com mais ou menos 18 anos) e a filosofia passou a ter maior importância na minha vida.

A Sociologia começou, comigo, como irmã da História e da Ciência Política, mas anda não dei a devida atenção a ela. Já atentei mais para a Ciência Política, que pretendo estudar a fundo. Já cogitei em fazer vestibular para Sociologia em 1999, mas acabei trocando, meses depois, pelo Direito, onde estou até hoje.

O Direito é o “caçula” das Humanidades, mas foi o scolhido como curso superior. Eu diria que tenho uma relação complexa com ele, alternando entre o amor e o ódio, mas desde já afianço que ele não deixará, jamais, de fazer parte da minha vida, seja qual for o rumo que ela tome. Ainda pretendo escrever um texto sobre isso noutra hora.


4)Sei que você teve também interesse grande em ciências naturais. O que aconteceu? Como está isso hoje?

Sim! É que, quando criança, eu me interessava muito por dinossauros. Sabia os nomes de muitos deles, o que comiam, em que época viveram, etc. Esse interesse me levou a pesquisar sobre a história natural do mundo, desde as eras mais primárias até à época actual. Era um fã de Darwin, embora nunca tenha lido A Origem das Espécies (até hoje ainda não li, aliás). Quando criança, aliás, falava seriamente em seguir a carreira de paleontólogo (risos), pensava em fazer faculdade de Biologia e talvez até um pouco de Química, essas coisas. Mas foi um interesse passageiro, que não tem mais grande influêencia sobre mim hoje.


5)E as Exatas?

Nunca fui afim das Exatas. Não que não veja lógica na Matemática ou na Física. Acontece que, como qualquer criança, a primeira ciência exata que a escola me apresentou foi a matemática. E o que se passa é que, quando eu estudava aquilo, eu não via correspondência alguma na realidade, tudo aquilo era para mim uma abstração total, bem diferente do que o que eu via quando estudava História ou lia um livro de ficção. Essa antipatia acabou passando sem dificuldade para a Física, embora eu gostasse mais dela do que de Matemática, justamente porque eu conseguia ver alguma coisa real na Física, e para a Química, que demanda um bom conhecimento matemático também. Confesso que, semanas após os exames vestibulares, já tinha esquecido boa parte da minha educação em Exatas e actualmente não sinto grande falta dela.

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